segunda-feira, 4 de julho de 2011

Entrar na Chuva

Batendo no vidro da janela, a água escorre, carrega em cada gota o brilho da luz dos postes. Penso nas ruas, em como estão; nas paredes dos prédios, todas muito molhadas. No chão do meu quarto, vejo os grãos de barro escuro, que eu trouxe nas travas de minhas botas. Escuto muito pouco barulho na rua, apenas alguns carros transitam.


Sem saber quem, escuto alguém caminhar e conversar na calçada, que fica logo abaixo de minha janela. Descem a ladeira, os dois sem guarda-chuva, comentando algumas coisas deste dia gelado. O estranho é que calmamente eles conversam na chuva. Como são descuidados, não pensam que podem ficar doentes!


Mais a frente, no meio da praça, dois velhinhos conversam sentados em um banco. Estão todos molhados, com o cabelos brancos grudados em suas testas. Gargalhadas para todos os lados, gestos para cima e para baixo. Estão rindo muito.


Não sei mais o que pensar, só vontade de rir sobre estas atitudes que estou vendo. Pessoas estão na rua, na chuva, neste frio e nem um pouco preocupadas se estão molhadas. Já surge do outro lado da praça, uma mulher pisando em cima do guarda-chuva, feliz, pulando livre daquela tralha de tecido e aço.


E mais uma surge, correndo, pulando sobre as poças. Parece apaixonada com o clima desta noite. Ela chega perto da senhora que quebrou o guarda-chuva e a abraça. Saltam dentro das poças.


As pessoas estão se entregando para chuva, sem medo algum. Se divertem, sem preocupação. Não sei como conseguem.


Agora os velhinhos se levantam, com jeito de partida para casa. As mulheres percebem a presença deles e acenam, como gesto de cumplicidade por aquele ato.


Os velhinhos começam a chegar perto de minha janela. Eu a abro correndo. Entra o ar gelado que impiedosamente toca em meu rosto, segurando meus lábios para não falar nada. Eles olham para mim e perguntam o que houve, dando risada do meu espanto com o frio. Pergunto a eles o que estão fazendo na chuva, eles respondem: se molhando. Com esta resposta novamente caem na gargalhada. Então pergunto se eles não têm receio de ficarem doentes. “Claro que não”, respondem. Veja como podem?


Saíram caminhando abraçados. Mas um dos velhinhos volta. Chega na minha janela novamente para me perguntar, se algum dia eu tive coragem para sair na chuva, conhecer meus limites, saber até que ponto eu era forte o suficiente para enfrentar todas as dificuldades. E sem deixar eu responder começa a falar, de que só é possível saber se somos resistentes ou frágeis quando entramos na chuva. Talvez o que falta entender de nossa tranquilidade aqui fora está em um detalhe, aquele que aquece o peito e deixa a vida mais leve: a alegria.